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quarta-feira, 6 de abril de 2011

CAMINHANDO NA CHUVA

Chuva. Meio da noite. Depois de uma viagem de mais de três horas, chuva.

Quando o ônibus chegou à rodoviária, apesar do mau tempo, considerou a possibilidade de caminhar até em casa. E essa alternativa adquiriu solidez quando olhou o cenário: as cabinas telefônicas, os guichês fechados das empresas rodoviárias, o olhar esperançoso dos motoristas de taxi, a lanchonete (deprimente e suja).

Saiu do prédio e, segurando a mala, iniciou a jornada.

Com a água a escorrer pelo rosto, colocou os óculos no bolso da camisa molhada. Os vários graus de miopia o fizeram sentir um ligeiro mal−estar. Percebeu que a partir daquele momento até que chegasse a seu destino, somente conseguiria ver imagens embaçadas, desfocadas.

Passou a mão nos cabelos e na face, na vã tentativa de enxugar o cansaço.

A avenida estava deserta, como se fosse alguma espécie de anuncio publicitário do silêncio urbano. Em vinte minutos de caminhada, ultrapassou dezenas de postes da iluminação pública, que se multiplicavam exponencialmente na noite.

Em intervalos irregulares, vários carros deslizaram pela rua, desenhando a solidão entre poças d’água.

Na primeira esquina, dobrou à direita. Seguiu em frente por quatro ou cinco quadras. Depois, dobrou novamente à direita. Passou mais um carro, o rádio ligado em alto volume.

Diante do colégio, cumprimentou o guarda−noturno e recebeu um seco "boa noite" em resposta. Na esquina seguinte, uma viatura da polícia se perdeu na névoa e na distância.

A umidade começou a incomodar, o frio invadindo o corpo, um leve tremor. Pensou no quanto, naquele instante, seria bom tomar uma xícara de chá ou uma taça de vinho. Doces ilusões custam caro, filosofou enquanto levava a mão molhada, outra vez, aos cabelos, como se isso fosse necessário para diminuir o desconforto.

Vários relâmpagos riscaram o céu vitrificado pelo temporal. Trovões. Dobrou à esquerda. Sem dar trégua, a chuva continuava intensa. Atravessou a rua. Desceu a ladeira. Contornou a praça. Caminhou uns 500 metros. Espirrou.

Em frente ao prédio em que mora, um alívio que não era alívio. Retirou do bolso o molho de chaves, abriu a porta do hall e entrou no edifício. Subiu pela escada os oito andares. Abriu a porta do apartamento e, nesse momento, sentiu uma vontade incontrolável de chorar.

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