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quarta-feira, 1 de junho de 2011

ESTÁ FALTANDO HUMOR

De todos os descompassos que caracterizam o mundo em que vivemos, a crescente falta de humor merece especial destaque. A razão capitalista, que normatiza a assepsia do comportamento humano na modernidade, relaciona o bem−estar das pessoas com a falta e/ou a abundância de dinheiro – e isso, de uma forma ou de outra, indica que não há mais lugar para aqueles que gostam de viver alegremente.

Essa "seriedade" caminha paralela com a tirania do politicamente correto, que bloqueia quaisquer manifestações humorísticas relacionadas com as "minorias", as "maiorias", os idiotas (que estão presentes em todas as classes econômicas, sociais e culturais), os pedantes, os ridículos, etc.

Está terminantemente proibido subverter as palavras (através de jogos semânticos, trocadilhos,...) ou brincar com as situações ou comportamentos. Sempre aparece um humilhado e ofendido para exigir respeito, consideração e carinho – mesmo quando não merece.

Ninguém conhece ou reconhece o valor de uma boa gargalhada. Qualquer quebra na seriedade implica em suspeita de conspiração, preconceito, escárnio, prepotência ou supremacia de classe sócio-econômica. Rir é um pecado - sem chance de absolvição!

"Cara feia" é a regra geral. Estamos convivendo com pessoas tristes e neuróticas. E que acreditam que a salvação para todos os males está nas prateleiras do supermercado das emoções baratas. Diante da caixa registradora (ou do traficante), segurando sacolas cheias de antidepressivos, sonham que basta abrir a carteira, pagar pelo anestésico e ser feliz.

É uma visão distorcida. Houve um tempo (e esse passado não esta muito distante) em que as dificuldades existenciais se resolviam com boas conversas e ótimas risadas. As pessoas se reuniam, contavam histórias, comentavam as imbecilidades da semana, trocavam experiências, faziam acordos e deixavam a angústia ir remoer o fígado de outros infelizes.

Paradoxalmente, a razão econômica está ensinando que os mal−humorados são mais felizes do que essa rapaziada que vive preocupada em ganhar dinheiro (e, como bônus, várias úlceras). Inclusive porque ser bem−sucedido na difícil arte do mau humor implica em algo mais do que a eterna irritação.

As "alfinetadas", as "sacanagens" o "humor negro", as fofocas maldosas, além de outras formas sofisticadas de "veneno", são, de certa forma, demonstrações de bom humor. E que precisa ser praticadas diariamente nas "vitimas".

Nesse sentido, uma lição de sabedoria pode ser encontrada no final de uma das cartas que o escritor argentino Juan Rodolfo Wilcock enviou, em 1955, para Pepe Fernandez:

No estoy triste, ¿de adónde se te ocurre que puedo estar triste? Practico el mal humor, pero no la melancolia.

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