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quarta-feira, 30 de maio de 2012

UMA VIDA MELHOR

O exílio é uma fratura incurável entre um ser humano e um lugar natal, entre o eu e seu verdadeiro lar: sua tristeza essencial jamais pode ser superada. E, embora seja verdade que a literatura e a história contêm episódios heróicos, românticos, gloriosos e até triunfais da vida de um exilado, eles não são mais do que esforços para superar a dor mutiladora da separação.

A citação é de Edward W. Said e serve de epígrafe para o filme Uma Vida Melhor (A Better Life. Dir. Chris Weitz, 2011).

Carlos Galindo (Demian Bichir, indicado para o Oscar de melhor ator em 2012) é um imigrante mexicano ilegal em Los Angeles, Califórnia. Trabalha o dia todo como jardineiro e, quando chega à casa em que vive com o filho, dorme no sofá. Luis (José Julián), 14 anos, não gosta de ir à escola e dorme na única cama que eles possuem. Enquanto o pai está ligado umbilicalmente com o México, com a situação socioeconômica dos "chicanos", o filho – que nasceu em Estados Unidos – vai descobrindo os valores impostos pela sociedade de consumo.

A distância (física, emocional) entre o pai e o filho aumenta exponencialmente a cada dia.

A chance de mudar esse panorama surge rapidamente − para os dois. Carlos pode comprar uma caminhonete e gerenciar a própria empresa de jardinagem. Luis pode entrar para uma pandilla e se afirmar diante da namorada (irmã de um dos chefes da gangue). As duas situações se apresentam como irresistíveis. No entanto, somente a primeira se concretiza. Mas não por muito tempo. No primeiro momento de descuido, a caminhonete é roubada. Paradoxalmente, é isso que salva Luis da vida criminosa.

Há algo de devastador na cena em que a caminhonete é roubada. O carro não é apenas um bem material. É uma metáfora da esperança, de uma vida melhor, do construir o futuro. O que parece ser uma homenagem ao neo-realismo italiano (Ladrões de Bicicleta, Dir. Vittorio de Sica, 1948, é uma das várias referências), também é o ponto fulcral da narrativa.

Juntos, pai e filho passam o sábado juntos, tentando recuperar o carro. Enquanto está junto do pai, pela primeira vez, a raiva do menino é amenizada (apesar de pequenos incidentes). Pela primeira vez, o pai torna público que vê no filho um companheiro. Enquanto aguardam pela abertura de um restaurante, onde trabalha o ladrão da caminhonete, eles vão até uma festa popular da comunidade mexicana. O pai fica melancólico por lembrar-se da vida deixada para trás, o filho tem dificuldades para entender o espanhol. São as lembranças de uma história borrada pelas necessidades econômicas que revelam o quanto o filho e o pai estão unidos e separados.

A cena em que recuperam a caminhonete lembra os filmes de ação – e, pela primeira vez, o filho olha com orgulho para o pai. Infelizmente, como cabe às histórias protagonizadas pelos perdedores, a jornada termina em visita às profundezas do horror. O pai é preso e deportado.

A perda do pai engrandece o filho, torna-o homem. Estar ausente da vida do filho estimula Carlos para voltar. O exílio é o cenário do heroísmo.

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