Haruki Murakami talvez seja o mais
conhecido escritor japonês contemporâneo. O seu último romance, 1Q84, dividido
em três volumes, não foi muito bem recebido pela crítica. A Internet está
entulhada de comentários depreciativos. Muitos desses registros estão
impregnados pelo saudosismo de quem queria repetir a experiência literária nos moldes de Norwegian Wood, Minha Querida Sputnik ou Kafka à Beira-mar. Houve até quem
dissesse que a chama da criatividade está se extinguindo. E isso, de uma forma
ou de outra, afastou alguns leitores.
Apaixonado por jazz, gatos e atletismo,
Murakami, manejando a voz narrativa pop, conseguiu equilibrar o antigo e o
moderno sem fazer muitas concessões ao banal. Ao contrário do que possa
parecer, isso não deve ser entendido como ofensa. Trata-se de um
elogio. O Japão, depois de 1945, está vinculado com o modo de vida do Ocidente. E
a literatura, por diversos motivos, não pode perder o vínculo com a História. Ou
seja, embora as narrativas épicas sobre o xogunato, junto com os dramas que
envolvem a decadência do Império, não possam ser descartadas, cabe entender que
nobres, camponeses, samurais e gueixas transitam por um universo em
decomposição. E que a cultura europeia e estadunidense (para o bem e para o
mal) está impregnada no modo de viver das novas gerações nipônicas.
O primeiro volume de 1Q84 transita pelo diferente, pelo estranhamento. O texto realista, sedimentado no verossímil, vai se transformando lentamente em ficção-científica (gênero que não é estranho a Murakami: Crônica do Pássaro de Corda, edição portuguesa).
A história de Aomame e Tengo vai se desenvolvendo em paralelo. Ela é professora de educação física e trabalha em uma academia com musculação e artes marciais – disfarce perfeito para encobrir algumas ações que executa com agilidade e competência: matar homens que maltratam mulheres. Ele ganha a vida como professor de matemática em uma escola preparatória. Amante de uma mulher mais velha, está se esforçando para se tornar escritor profissional. Tengo e Aomame estudaram na mesma sala durante o ensino elementar. Depois, por motivos alheios ao entendimento das crianças, perderam o contato.
Komatsu, que é uma espécie de mentor de
Tengo, o convence a reescrever um romance enigmático, que irá concorrer a um
prêmio literário importante. Crisálida de Ar foi escrito por Fukaeri
(pseudônimo de uma adolescente protegida do professor de filosofia Ebisuno). A
série de situações pouco convencionais que surgem como consequência da
visibilidade alcançada pelo livro resulta em pessoas desaparecidas, assassinatos,
pedofilia, grupos políticos radicais e seitas religiosas.
Como esse conjunto de questões será
encaixado na narrativa é o grande mistério que somente o segundo e o terceiro
volume do romance conseguirão esclarecer. Junto, há a possibilidade de Tengo e
Aomame se encontrarem em algum ponto da história.
P.S.: Uma característica que merece
consideração nos romances de Haruki Murakami é a absoluta incapacidade para
descrições intimas. Em algumas situações, não há como
negar que algumas atividades em cima de uma cama fazem parte do enredo amoroso.
Murakami, em lugar de superar o problema com o uso elementar de elipses,
prefere utilizar frases mecânicas, artificiais – e que destroem o andamento
narrativo.
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