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terça-feira, 27 de dezembro de 2016

ANTOLOGIA POSTAL

Fiz a assinatura da coleção de poesia Antologia Postal, editada pela Azougue (em parceria com a Cozinha Experimental). Doze volumes que se propõem a mapear parte do versejar recente – embora alguns dos autores que foram/serão publicados não possam ser qualificados como novidades. No mundo a-pós-a-moderna-idade (seja lá o que isso for!), o conceito de literatura contemporânea se tornou fluído, amorfo e indefinido. Ao mesmo tempo em que cataloga uma série de experiências (de linguagem, de técnica e de invenção), ocorre o tropeçar ou a elevação em itens acessórios (pseudo-inovação, variações sobre o mesmo tema, reinterpretação, ressignificação,...). Como resultado dessa salada, surge a multiplicidade de leituras para o poema – e isso é bom. O ruim é que o contemporâneo está mais próximo do monstro criado por Frankenstein do que de algum anjo da Renascença.  

De cada um dos doze livros serão publicados trezentos exemplares numerados – apenas trezentos (diz o editor) – com capa dura revestida em tecido e acabamento manual. Complementando os poemas, há uma entrevista com o homenageado. Tudo isso ao custo de R$ 600,00. Parcelei em quatro suaves prestações mensais. Consegui pagar todas. Para alegria dos editores. Afinal, nestes tempos sombrios, em que todos se queixam da crise econômica, a quantia envolvida na transação não é exatamente um par de moedinhas.

CURRICULUM

(Rubens Rodrigues Torres Filho)


Ser qualquer um mas ter alma de nobre.

Correr perigos sem temor indigno. 

Paquerar a princesa apetitosa.

Vencer o ogro, transformar o rei em sogro.


e envelhecer amado pelo povo.


Inevitavelmente, antes de assumir o compromisso, tive que perguntar para mim mesmo se não estava me envolvendo em uma nova velha versão da proposta que idealiza o livro como fetiche. Quer dizer, essa coleção tem um caráter de obra de arte portátil (valorizada pela excelente trabalho de edição, que facilita a expansão dos poemas pela página em branco), além de ser (por enquanto) inacessível para o grande público. Será que não estava mergulhando em um projeto similar ao que existe em artes plásticas, ou seja, comprar cópias numeradas e assinadas de litogravuras e/ou xilogravuras? Não consegui encontrar uma resposta satisfatória para esse questionamento. Inclusive porque, na contracorrente, cabe entender que o incentivo a planos similares permitirá que a poesia ganhe uma maior visibilidade. E, consequentemente, atrair novos leitores. 

E antes que alguém imagine algo que não escrevi ou pensei, cabe registrar que estou satisfeitíssimo (assim, no superlativo!) por ter aderido ao projeto. Um dos motivos é que, durante algum tempo, muito tempo, para ser sincero, deixei a poesia de lado. Quer dizer, os clássicos continuaram habitando a minha memória, não são raras as circunstâncias que flagro a mim mesmo entoando – como um mantra – algum verso que anotei mentalmente em algum momento da vida. Mas, em consequência dessa negligência, perdi o contato com alguns dos mais importantes poetas dos últimos cinquenta anos. Está na hora de retomar a relação afetiva com a poesia, disse para mim mesmo. Complementando, não posso deixar de citar um item relativamente significativo nessa conversa: a importância da Internet na divulgação do trabalho de alguns escritores. Foi lendo poemas esparsos aqui e ali que percebi o quanto estava desatualizado e que, em ritmo “antes tarde do que nunca”, deveria mudar o curso do barco e singrar novos mares.

COGITO

(Torquato Neto)


eu sou como eu sou
pronome
pessoal intransferível
do homem que iniciei
na medida do impossível


eu sou como eu sou
agora
sem grandes segredos dantes
sem novos secretos dentes
nesta hora


eu sou como eu sou
presente
desferrolhado indecente
feito um pedaço de mim


eu sou como eu sou
vidente
e vivo tranquilamente
todas as horas do fim


Os quatro primeiros livros (Roberto Piva, Torquato Neto e Rubens Rodrigues Torres Filho, Guilherme Zarvos) foram publicados em 2016. Recebi o livro de Zarvos nos primeiros dias de 2017. Nos próximos meses os assinantes receberão os volumes dedicados a Alberto Pucheu, Carlito Azevedo, Claudia Roquette-Pinto, Claudio Willer, Eucanaã Ferraz, Francisco Alvim, Frederico Barbosa, Glauco Mattoso, Josely Vianna Baptista, Leonardo Fróes, Lu Menezes, Paulo Henriques Britto, Renato Rezende e Ricardo Aleixo. Como o número de poetas é superior ao número de livros a serem publicados, imagino que alguns volumes serão repartidos ou haverá uma segunda assinatura para quem quiser continuar participando da brincadeira.                     

SARDANAPALUS

(Roberto Piva) 


corre a língua
louca na superfície
da coxa em fogo
sua voz
sua anca trêmula
na montanha
da morte
eu & você vivemos
o relâmpago
o momento de amor
desatina
você delira

em suor & azul
metais explodem
no ar &

caem em cinzas
na folhagem
tudo respira o
prazer do mundo
corpos elétricos
se encaixam
& se amparam


Diante dos quatro primeiros volumes, extasiado pelos poemas, e há alguns que são absolutamente geniais, fiz a pergunta derradeira: qual é o propósito da poesia contemporânea?  Sem cair no maniqueísmo que resulta de discussões em que confrontam o certo e o errado, respondo para mim mesmo que nunca acreditei que a poesia possui (muitos) compromissos com as questões práticas. Ou melhor, sei que essas demandas são importantes, mas não são as únicas, e, dependendo da circunstancia, não são as mais significativas (para a poesia). Então, de que deve se ocupar a poesia? Confesso que não tenho a resposta. Às vezes, muitas vezes, sou tomado pela sensação de que jamais terei. Melhor assim. Para quem flerta com o abismo, a poesia multiplica o prazer da aventura. Ou do perigo. Que se no es lo mismo, pero es igual, como disse alguém em outro contexto.

Independente do grau de sofisticação literária ou da relação afetiva do leitor com o seu poeta favorito, a seleção do material publicado, nos quatro primeiros volumes da Antologia Postal (Roberto Piva, Torquato Neto, Rubens Rodrigues Torres Filho e Guilherme Zarvos), não merece ser alvo de reprimenda. Somente aplausos. Além disso, a reunião de alguns poemas do Piva, inéditos em livro, publicados de forma esparsa (revistas, jornais, antologias,...), fornece para a coleção uma grande relevância arqueológica e historiográfica. Em relação aos poemas selecionados de Torquato Neto e Rubens Rodrigues Torres Filho não há novidades. Mas, a leitura de textos como Go Back e Cogito (Torquato) ou Do Vinho para a Água e Curriculum (Torres Filho) equivale ao encontro com um velho amigo – desses que (independente da distância física) sempre estiveram próximos. Quanto ao Guilherme Zarvos, bem... ele me era desconhecido. E receber o livro (que contém parte de sua poesia) foi uma grata surpresa, ou melhor, uma alegria.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

HISTÓRIA DE QUEM FOGE E DE QUEM FICA

O caudal romanesco Tetralogia Napolitana (integrado pelos volumes A Amiga Genial, História do Novo Sobrenome, História de Quem Foge e de Quem Fica e História da Menina Perdida), escrito pela italiana Elena Ferrante, conta a história da amizade entre Rafaella (Lila, Lina) Cerullo e Elena (Lenu) Greco. Nascidas em um bairro de classe econômica precária (em Nápoles, Itália), as duas mulheres enfrentam o mundo – cada uma a sua maneira. Lila é colérica, pouco disposta a fazer concessões, extremamente inteligente. Lenu é cordata, muitas vezes insegura, intelectualmente esforçada. De alguma maneira, na infância e na adolescência, a primeira domina a segunda.

Em determinado momento, embora continuem unidas, as amigas se separam. Lila prefere – opondo-se aos conselhos que recebe – fazer um casamento de conveniência com um sujeito que todos sabem ser um mau caráter. Lenu – acreditando que encontrou o melhor caminho para fugir da pobreza – vai para a universidade. São escolhas divergentes e que produzem feridas que jamais cicatrizarão.

O terceiro volume dessa saga, História de Quem Foge e de Quem Fica, focaliza uma pedaço da vida adulta das duas mulheres. Lila continua administrando a vida de forma intempestiva. Embora tenha “comido o pão que o diabo amassou”, após se separar do marido, conseguiu sobreviver. Simultaneamente, manteve o orgulho e os ideais em que acredita (com direito a um flerte com o Partido Comunista Italiano). O mesmo não se pode dizer de Lenu, que não encontrou a felicidade na carreira universitária, no casamento ou no relativo sucesso do romance que escreveu.

Na medida em que o universo social, político e afetivo das duas mulheres se expande, a trama adquire novos contornos. Surgem e desaparecem vários personagens – cada um multiplicando as complicações. O clima político, refletido nas lutas (físicas) entre comunistas e fascistas, revela uma Itália fragmentada, sem saber se apoia as lutas sociais ou se regride à Idade Média. Enquanto Lila consegue visualizar objetivamente o microcosmo opressor em que vive (apesar de não encontrar uma forma de superá-lo), Lenu conduz seus interesses para questões intelectuais alienantes. Independente dos óbvios problemas que existem entre essas duas formas – complementares – de enfrentar o mundo concreto, é possível perceber que o “zeitgest” está repleto de nuances e que jamais pode ser reduzido a esquemas binários (verdade e mentira, certo ou errado, razão e sentimento).

A maternidade também se revela em contraste. Enquanto Lila carrega Gennaro para lá e para cá, sem tentar negar que o menino integra uma parte de sua vida atribulada, o nascimento das filhas de Lenu (Adele e Elsa) catalisa uma série interminável de crises. A maternidade em Lila serve para diminuir o egoísmo e construir uma consciência coletiva; a maternidade em Lenu concretiza o colapso afetivo e profissional. Nos dois casos, o adensamento da substância humana supera a superficialidade dos arranjos sociais.

Além disso, é através do espelho literário que se visualiza a condição feminina. Inumeráveis exemplos são projetados na Tetralogia Napolitana. Como uma herança maldita, transmitida pelas mães às filhas, cabe às mulheres sobreviver em um mundo hostil, onde os homens não se constrangem em agredir, ferir, dominar, destruir. Tanto Lila quanto Lenu querem romper com esse círculo vicioso  a questão fundamental está no método com que cada uma delas escolhe para derrubar o muro da opressão.       

Nápoles
É o exame microscópico das diferenças que existem entre Lila e Lenu que estabelece o ponto mais alto da prosa fluida e estonteante de Elsa Ferrante. Seus livros foram escritos para ser devorados de forma ininterrupta. São leituras guiadas pela ansiedade de descobrir o que está escrito na página seguinte. Mas, sobretudo, são textos iluminados pela presença de Rafaella (Lila, Lina) Cerullo, provavelmente uma das personagens femininas mais interessantes da literatura contemporânea.  

– Vocês professores insistem tanto no estudo porque é com ele que ganham a vida, mas estudar não serve para nada, nem melhora as pessoas, ao contrário, torna-as mais cruéis.
– Elena ficou mais cruel? 

– Não, ela não.
– E por quê? 

Lila meteu o gorro de lã na cabeça do filho: 

– Desde pequenas fizemos um pacto: a cruel sou eu.


Entre dramas e tragédias – Lila em Nápoles, Lenu em Florença –, encontros e desencontros, pobreza e riqueza, maridos e amantes, afeto e violência, descobertas e segredos, nada prepara o leitor para o atordoamento. Não há adjetivo mais exato do que esse para expressar os acontecimentos narrados nas ultimas vinte ou trinta páginas de História de Quem Foge e de Quem Fica. A racionalidade e a segurança, elementos que pareciam ser estruturantes no livro, são substituídas pela inversão de papeis entre Lila e Lenu. A linha reta e o andamento seguro se transformam em algo improvável e confuso. Ou melhor, em algo surpreendente.

Em síntese: toda essa complicação tem um significado muito simples: a leitura do quarto volume da tetralogia (História da Menina Perdida) é necessária – e urgente.


TRECHO ESCOLHIDO


Mas logo em seguida retornou ao salão, decidida a dizer o que pensava para não se sentir diminuída. Agora um jovem de cabelo encaracolado estava falando com grande competência sobre a siderúrgica Itadlsider e o trabalho por empreitada. Lila esperou que o rapaz terminasse e, ignorando o olhar perplexo de Enzo, pediu a palavra. Falou longamente, em italiano, enquanto Gennaro se agitava em seu colo. Começou baixinho, depois prosseguiu em meio ao silêncio geral com uma voz talvez muito alta. Disse provocadora que não sabia nada da classe operária. Disse que só conhecia as operárias e os operários da fábrica em que trabalhava, pessoas com as quais não havia absolutamente nada a aprender senão a miséria. Vocês imaginam – perguntou – o que significa passar oito horas por dia mergulhado até a cintura na água de cozimento das mortadelas? Imaginam o que significa ter os dedos cheios de feridas de tanto descarnar ossos de animais? Imaginam o que significa entrar e sair das câmaras frigoríficas a vinte graus negativos e receber dez liras a mais por hora – dez liras – a título de insalubridade? Se imaginam, o que acham que podem aprender com gente que é forçada a viver assim? As operárias devem permitir que chefetes e colegas passem-lhe a mão na bunda sem dar um pio. Se o patrãozinho sentir necessidade, uma delas deve acompanhá-lo até a câmara de maturação – coisa que já o pai dele fazia, e talvez até o avô – e ali, antes de pular em cima de você, esse mesmo patrãozinho lhe faz um discursinho batido sobre como o cheiro dos salames o excita. Homens e mulheres se submetem a revistas corporais, porque na saída há uma coisa chamada “triagem” que, quando se acende o vermelho em lugar em vez do verde, quer dizer que você está levando escondido salames e mortadelas. A “triagem” é controlada pelo vigia, um espião do patrão, que acende o vermelho não só para possíveis furtadores, mas especialmente para moças bonitas e arredias e para os encrenqueiros. Esta é a situação na fábrica onde eu trabalho. O sindicato nunca entrou ali, e os operários não passam de gente pobre e chantageada, sujeita à lei do patrão, ou seja, eu lhe pago e portanto a possuo e possuo sua vida, sua família e tudo o que está à sua volta, e, se você não fizer do jeito que eu mando, acabo com sua raça.   

sexta-feira, 16 de dezembro de 2016

A AMIZADE EM CINQUENTA FRASES

Marcus Tullius Cicero (106 a. C - 43 a. C)
– Tu me eras tão querido! Tua amizade me era mais preciosa que o amor das mulheres. (Bíblia. Samuel, 1:26)

– A amizade é muito mais trágica que o amor: dura mais. (Oscar Wilde)

– A amizade é um amor que nunca morre. (Mário Quintana)

Dos amores humanos, o menos egoísta, o mais puro e desinteressado é o amor da amizade. (Cícero)

A amizade, depois da sabedoria, é a mais bela dádiva feita aos homens. (François de La Rochefoucauld)

– A amizade é uma predisposição recíproca que torna dois seres igualmente ciosos da felicidade um do outro. (Platão)

A amizade é irmã do amor, mas não na mesma cama. (Sophie Arnould)

Amizade, casamento de dois seres que não podem dormir juntos. (Jules Renard)

As ligações de amizade são mais fortes que as do sangue da família. (Giovanni Boccaccio)

– Amizade é como o dinheiro, mais fácil fazer do que manter. (Samuel Butler)

A amizade é como os títulos honoríficos: quanto mais velha, mais preciosa. (Goethe)

A amizade não se busca, não se sonha, não se deseja; ela exerce-se (é uma virtude). (Simone Weil)

François de La Rochefoucauld (1613-1680)
– Amigo é aquele que sabe tudo a seu respeito e, mesmo assim, ainda gosta de você. (Kim Hubbard)

– Com o tempo, qualquer amigo muito próximo e querido acaba se tornando tão inútil quanto um parente. (George Ade)

– O amor pode morrer na verdade; a amizade, na mentira. (Abel Bonnard)

– Todo mundo tem uma porção de amigos que detesta e um ou outro inimigo de que gosta. (Millôr Fernandes)

– Perdoamos facilmente nos amigos os defeitos que não nos incomodam. (François de La Rochefoucauld)

As coisas mais desagradáveis que os nossos piores inimigos nos dizem pela frente não se comparam com as que nossos amigos dizem de nós pelas costas. (Alfred de Musset)

– O amigo nunca é fiel. Só o inimigo não trai nunca. O inimigo vai cuspir na cova da gente. (Nelson Rodrigues)

Se na hora de uma necessidade os amigos são poucos? Ao contrário! Basta fazer uma amizade com alguém para que, logo que este se encontre numa dificuldade, pedir dinheiro emprestado. (Arthur Schopenhauer)

– É preferível não ter amigos do que os ter mais nocivos que inimigos. (William Shakespeare)

– Preferia perder meu melhor amigo ao pior inimigo. Para ter amigos só é preciso boa índole; mas quando um homem não tem inimigos, certamente há algo de desprezível nele. (Oscar Wilde)

– A amizade é, acima de tudo, certeza – é isso que a distingue do amor. (Marguerite Yourcenar)

Oscar Wilde (1854-1900)
Nenhum gesto de amizade, por muito insignificante que seja, é desperdiçado. (Esopo)

– A amizade é um meio de nos isolarmos da humanidade cultivando algumas pessoas. (Carlos Drummond de Andrade)

– A amizade duplica as alegrias e divide as tristezas. (Francis Bacon)

A amizade é como a sombra na tarde - cresce até com o ocaso da vida. (Jean de La Fontaine)

– Amigo é o sujeito com quem você conversa sem olhar o relógio. (Ulysses Guimarães)

– O que os homens denominaram amizade é somente uma sociedade, zelo mútuo de interesses e troca de bons ofícios; é comércio, enfim, em que o amor-próprio tem sempre algo a ganhar. (François de La Rochefoucauld)

– As amizades mais profundas vêm desse sofrimento a dois, a três. Nunca dissemos nada de importante, mas criamos uma ponte emocional, subterrânea, com os amigos de infância, que, em geral, sobrevivem às intempéries e à corrosão do tempo. (Paulo Francis)

– Seleciono meus amigos pela aparência, meus conhecidos pelo caráter e meus inimigos pelo intelecto. Um homem deve ser muito cuidadoso na escolha dos inimigos. (Oscar Wilde)

– Mais vergonhoso é desconfiar dos amigos do que ser por eles logrado. (François de La Rochefoucauld)

– A amizade desenvolve felicidade e reduz o sofrimento, duplicando a nossa alegria e dividindo a nossa dor. (Joseph Addison)

Nelson Rodrigues (1912-1980)
Não há solidão mais triste do que a do homem sem amizades. A falta de amigos faz com que o mundo pareça um deserto. (Francis Bacon)

– Quando defendemos os nossos amigos, justificamos a nossa amizade. (Marquês de Maricá)

– A amizade é constante em tudo, menos nos assuntos do amor. (William Shakespeare)

– Duas mulheres raramente se tornam íntimas, exceto às custas de uma terceira pessoa. (Jonathan Swift)

Convém tratar a amizade como os vinhos, desconfiando das misturas. (Sidonie Colette)

A amizade é semelhante a um bom café; uma vez frio, não se aquece sem perder bastante do primeiro sabor. (Immanuel Kant)

– Uma amizade fundada em negócios é melhor do que um negócio fundado em amizade. (John D. Rockefeller)

– Há na amizade pura um perfume que aqueles que são medíocres não podem respirar. (Jean de La Bruyère)

Não é amigo aquele que alardeia a amizade: é traficante; a amizade sente-se, não se diz... (Machado de Assis)

Alfred de Musset (1810-1857)
A glória da amizade não é a mão estendida, nem o sorriso carinhoso, nem mesmo a delícia da companhia. É a inspiração espiritual que vem quando você descobre que alguém acredita e confia em você. (Ralph Waldo Emerson)

– A julgar pela maior parte de seus efeitos, o amor mais parece ódio que amizade. (François de La Rochefoucauld)

– De madrugada o melhor amigo do homem é o cachorro-quente. (Millôr Fernandes)

– O melhor amigo do homem é o uísque. O uísque é o cachorro engarrafado. (Vinicius de Moraes)

– A melhor maneira de começar uma amizade é com uma boa gargalhada. De terminar com ela, também. (Oscar Wilde)

Em política, a comunhão de ódios é quase sempre a base das amizades. (Charles Tocqueville)

– A intimidade entre as mulheres é sempre ao contrário: começa com a troca de grandes revelações e termina com a troca de abobrinhas. (Elisabeth Bowen)


Só existe um amigo verdadeiramente sincero – o amigo do alheio. (Millôr Fernandes)

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

O MARECHAL DE COSTAS


Toda biografia é como adivinhar pelas costas o rosto de alguém. Damos à pessoa um traço possível. Quando ela se vira, pode ser outra. Pode ser, aliás, o contrário, como uma estátua que estranha o rosto de seu modelo vivo.
O Marechal de Costas, de José Luiz Passos


A literatura brasileira contemporânea estava desconectada com a História. Estava. Quer dizer, houve tempo que esteve mais. Muito mais. Agora, sem saber distinguir se isso é bom ou ruim, está um pouco menos. Mas, nesse caso, apesar do trocadilho ruim, menos não é mais. Literatura é documento, é testemunho, é retrato de época. Obviamente, uma parcela dos escritores em atividade procura – com todas as forças e palavras – negar esse fato. Eles preferem preencher páginas e páginas com variações em torno dos próprios umbigos. Sai cada sujeira...

Ao estabelecer uma ligação entre alguns episódios da vida do alagoano Floriano Viana Peixoto (1839-1895), segundo Presidente do Brasil, e uma cozinheira que participa de um comício em favor de Dilma Rousseff, a narrativa consegue – através da comparação histórica – demonstrar que a gênese política da República está alicerçada em algum tipo de golpe de Estado. Suposta parente distante do Marechal, o que a torna uma espécie de curiosidade na casa em que trabalha, cabe à mulher narrar os fatos contemporâneos. Em compensação, os eventos ocorridos no Império e nos dois primeiros governos da República estão descritos por um narrador impessoal, em terceira pessoa, que constantemente recorre a fontes bibliográficas. Desta forma, como compete às linhas paralelas (que nunca se encontram no infinito), a espinha dorsal da narrativa (que parece ser muito tênue e prestes a se romper a qualquer momento) se mantém integra, permitindo que os dois textos se complementem e forneçam coerência ao enredo.

O “Marechal de Ferro” foi eleito vice-presidente do Marechal Manuel Deodoro da Fonseca (1827-1892), em uma eleição indireta onde obteve mais votos do que o titular. Assumiu o poder entre 23 de novembro de 1891 e 15 de novembro de 1894, após a renúncia de Deodoro da Fonseca. Para alguns historiadores, Floriano foi o primeiro conspirador republicano, pois em nada contribuiu para ajudar o governo que o antecedeu. Conhecido como ter governado o país com métodos autoritários, não poupou energias para sufocar a 1ª e a 2ª Revolta da Armada, no Rio de Janeiro, e a Revolução Federalista, no Rio Grande do Sul. Apesar disso, ou talvez por causa disso, ao descrever a vida de Floriano (perfilhado pelo tio, participando da Guerra do Paraguai, leitor de biografias de Napoleão), a narrativa humaniza a figura histórica, confere traços emocionais a alguém que os livros de história não costumam elogiar.

Dois personagens acompanham Floriano. O primeiro é o sargento da marinha Silvino Honório de Macedo, um dos lideres da Revolta da Armada e que foi fuzilado como conspirador. Ao contrapor o ditador com um idealista, o texto mostra as distâncias que existem entre aqueles que exercem o poder e as reivindicações de caráter social. O segundo é Josina Vieira de Araújo Peixoto, esposa (prima, irmã adotiva) de Floriano, mãe de oito filhos, aquela que o acompanha em todos os momentos – embora não concorde com certas atitudes do marido.

Contemporaneamente, a cozinheira (que também é alagoana) está na companhia do advogado Ramil, de seu filho, Ramil Jr., e de um professor. Como não consegue ficar calado, o professor esbanja conhecimentos e faz incontáveis citações de filósofos, escritores, homens públicos. Todo esse esforço resulta em um arremedo de compreensão da situação político-econômica do Brasil. Em determinado momento, talvez para encerrar aquela algaravia, Ramil pai propõe ir até o centro da cidade, para ver uma manifestação popular que está ocorrendo naquele momento. Então, vamos ver essa política toda acontecendo?, pergunta para o filho, para a cozinheira e para a visita. Próximos do atordoamento, pois ninguém esperava por esse tipo de atitude, chamam um táxi e se dirigem à Cinelândia, onde constatam que a união da teoria com a prática causa uma nova cicatriz no corpo machucado do país.

Neste país é impossível qualquer alteração da ordem pública por parte do povo, diz um trecho da narrativa, parafraseando a frase famosa de Aristides Lobo que, quando da proclamação da República, afirmou que o povo assistiu a tudo bestializado, sem compreender os acontecimentos. Essa situação reverbera na atualidade, quando o parlamento brasileiro produziu um “golpe branco” (destituindo uma presidente da República que era contrária aos interesses de alguns segmentos políticos e econômicos) e que, salvo protestos episódicos, foi assimilado pelos brasileiros como um ato natural.  

A tradição (ou melhor, a traição) iniciada por Floriano se repetiu várias vezes na história da República e, provavelmente, será reencenada em muitas outras oportunidades. No Brasil, a História se tornou apenas um registro cronológico – jamais será uma ponte para o aprendizado. A democracia, como compete à ficção, se transformou em uma figura de retórica a enfeitar (enfeiar) os tristes tropiques.  

Ao refletir sobre dois momentos do Brasil, misturando em doses desiguais História e ficção, José Luiz Passos produziu um romance muito interessante (apesar da linguagem levemente áspera) e que não se exime de apontar o autoritarismo que permeia todos os instantes da vida política brasileira.   


TRECHO ESCOLHIDO


O professor disse, Veja só. Só quem dá opinião e se vangloria dela é a classe média. Isso tudo que vocês estão vendo é radicalismo da classe média. O aristocrata não dá opiniões, inspira obediência posando com a sua linhagem. O proletário só tem, como diz seu próprio nome, a prole. Não tem tempo para entrar no mercado das ideias, o dia é curto. O alto burguês, capitão de indústrias, por exemplo, comanda com a caneta e um carimbo. Não sobe no plano das abstrações, porque ali não há o que ele quer, acumular posses. O pragmatismo dessas três classes obviamente a classe média não herdou, verdade? Vive numa sopa de opiniões, aspirando ser como um aristocrata, consumir como um burguês e, ainda por cima, se queixar de que é difícil manter a dignidade do trabalho, terreno dos proletários.


Marx já disse, Karl Marx, que fez da economia uma filosofia. Num lindíssimo texto sobre a middle class inglesa, ele disse, A onda industrial que fez brotar o ressentimento dos trabalhadores com a aristocracia se amplia na migração desse conflito, digamos, que hoje opõe o proletário à classe média. Aliás, no saudoso século XX a agitação política dos trabalhadores ensinou a classe média a odiar o confronto político aberto, nas ruas, pondo abaixo as instituições do confronto. É como na canção que diz, Família não joga pedra em janela, joga pedra no gari. Aquele famoso sambinha, apesar de paulista, tinha jogo de cintura, concordam? Grande samba político, enganou até a ditadura. Enfim, a classe média ainda hoje imita a aristocracia na pose dos seus idealismos descolados do mundo material. Mas um dia vai ver que a reputação é monopólio da nobreza de sangue, logo em seguida vai ser fisgada por uma dessas filosofias do pós-moderno. Orgulhosa desse tino pela via do prazer, pela via crucis do corpo, como disse Clarice Lispector, vai ver os filhos sendo arrastados pra fora das universidades, a educação entregue a um bando de retrógrados, os evangélicos se metendo na política, e a polícia levando no domingo todo mundo pelo braço à igreja. Isso como, aliás, já está acontecendo em São Paulo. Eu estudei na USP mas sou muito crítico de São Paulo. Desses 65 mil que estão vendo aí, segundo a Polícia Militar do belo Rio, desses garanto que pelo menos 50 mil ou mais são de classe média. Estão balançando o chocalho das opiniões sem base.


Então o professor, cansado de discursar, fez uma pausa, lambendo os beiços. Depois continuou, Já na arte, por exemplo, isso é um pouco mais complicado. Que ela pertence e, ao mesmo tempo, não pertence ao reino das opiniões, e ele estirou um braço numa onda larga, lentamente, que se espalhava até sua mão apontar para um mural pintado no paredão de um prédio comercial. O grafite era um crânio imenso, com margaridas nos olhos, mastigando a bandeira do Brasil. Embaixo havia um lema. O PETRÓLEO É NOSSO. A PETROBRAS TAMBÉM. Mas o professor não leu isso. Em vez, falou, Vita brevis, ars longa, iudicium difficile. A vida é breve, a arte é longa e o juízo difícil, essa é do meu tempo de seminarista, ele admitiu.  

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

O PODER, EM CINQUENTA E UMA FRASES

Apparício Fernando de Brinkerhoff
Torelly, Barão de Itararé, 1895-1971
– Na história do mundo, ninguém jamais lavou um carro alugado. (Lawrence Summers)

– A arte do compromisso é dividir o bolo de modo que cada um pense ter ficado com o pedaço maior. (Laurence J. Peter)

– Uma guerra se faz em nome de ideias e termina em nome de interesses. (Carlos Drummond de Andrade)

– Nascer estadista em país subdesenvolvido é como nascer com um tremendo talento de violinista numa tribo que só conhece a percussão. (Millôr Fernandes)

– Não gosto de política, gosto de poder. Política para mim é um meio de chegar ao poder. (Carlos Lacerda)

– É praga destes tempos que os cegos sejam guiados pelos loucos. (William Shakespeare)

– A política é a arte de procurar problemas, encontrá-los, fazer o diagnóstico errado e depois aplicar mal os remédios errados. (Groucho Marx)

– As grandes nações sempre agiram como gangsteres; as pequenas, como prostitutas. (Stanley Kubrick)

– Política é a arte de obter votos dos pobres e recursos dos ricos, prometendo a cada grupo defendê-lo contra o outro. (Oscar Ameringer)

– De todas as coisas “organizadas”, é o Estado, em qualquer parte ou época, a mais mal organizada de todas. (Fernando Pessoa)

– Se quisesse punir uma província, deixaria que fosse governada por um filósofo. (Frederico II, o grande)

– Há uma nítida diferença entre o estadista e o político. O primeiro é alguém que pertence à nação; o segundo, alguém que pensa que a nação lhe pertence. (Antônio Ermínio de Moraes)

– Um conservador é um homem excessivamente covarde para lutar e excessivamente gordo para fugir. (Lafayette Ronald Hubbard)

– Não espere que a solução venha do governo. O governo é o problema. (Ronald Reagan)

Millôr Viola Fernandes, 1923-2012
– O que é a história? É a soma de relatos, quase todos falsos, de eventos todos menores, provocados por políticos quase todos velhacos e executados por soldados quase todos patetas. (Ambrose Bierce)

– A democracia é o pior dos regimes, com exceção, naturalmente, de todos os outros. (Winston Churchill)

– O poder não satisfaz, ou melhor, é como a droga – que exige sempre doses maiores. (Luciano de Crescenzo)

– Há três maneiras de se chegar ao desastre: a mais rápida é pelo jogo; a mais agradável é com as mulheres; e a mais segura é consultar um economista. (Georges Pompidou)

– Não entendo como alguns escolhem o crime, quando há tantas maneiras legais de ser desonesto. (Laurence J. Peter)

– Se o governo administrar o Saara, em cinco anos faltará areia. (Milton Fredman)

– No Brasil, a vida pública é, muitas vezes, a continuação da privada. (Barão de Itararé)

– Políticos que se queixam da imprensa são como comandantes de navio que se queixam do mar. (Mark Twain)

– A virtude nunca é expulsa da corte a chibatadas. Por lá tratam-na muito bem, com o intuito de retê-la o máximo possível. No entanto, está sempre de passagem. (William Shakespeare)

– Em política tudo é permitido, exceto deixar-se surpreender. (Charles Maurras)

– Por mais hábil que seja, o político acaba sempre cometendo alguma sinceridade. (Millôr Fernandes)

– Detesto as vítimas que respeitam seus carrascos. (Jean-Paul Sartre)

– Se quisermos prevenir a violência, não precisamos de menos democracia. Precisamos de mais. (Frederic Wertham)

George Bernard Shaw, 1856-1950
– Somente o inimigo é fiel. O inimigo não trai nunca. Ele vai cuspir na cova da gente. (Nelson Rodrigues)

– A liberdade do dinheiro é inimiga da liberdade das pessoas. (Eduardo Galeano)

– O estadista vê o futuro; o político, o dia seguinte. (Winston Churchill)

– Um escravo tem um senhor. Mas o homem ambicioso tem muitos senhores: todas as pessoas que lhe podem ser úteis para ele subir na vida. (Jean de La Bruyère)

– Os lideres podem cair de duas maneiras: com glória, na liça política, inclusive eliminados fisicamente; e por capitulacionismo, por covardia, por medo. (Ulisses Guimarães)

– O pior analfabeto é o analfabeto político. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais. (Bertolt Brecht)

–Toda vez que preencho um cargo, faço cem descontentes e um ingrato. (Luís XIV)

– (...) enquanto os falcões enquanto falcões e os pardais enquanto pardais professam amor a Deus, a tendência natural dos falcões para abater pardais continua inabalável. (Luiz Nazário)

–O pior da ditadura é o guarda da esquina. (Pedro Aleixo)

Julius Henry Marx (Groucho Marx), 1890-1977

– Um banco é um estabelecimento que nos empresta um guarda-chuva num dia de sol e nos pede de volta quando começa a chover. (Robert Frost)

– O problema de Brasília é o tráfico de influências, enquanto o do Rio é a influência do tráfico. (Zózimo Barroso do Amaral)

– Os políticos são como maus cavaleiros, tão preocupados em se manter na sela que nem prestam atenção para onde estão indo. (Joseph Schumpeter)

– O capital é como a água, sempre flui por onde encontra menos obstáculos. (Antonio Delfim Netto)

– Não há exceção – poder conquistado pela força só se mantém pela força e só sai à força. (Millôr Fernandes)

– Seja legal com os cê-dê-efes. Existe grande probabilidade de um deles ser seu chefe um dia. (Bill Gates)

– Corrupção escondida vale tanto como pública; a diferença é que não fede. (Machado de Assis)

– Não há ateus numa trincheira nem ideologia numa crise financeira. (Ben Bernanke)

– Há duas formas de mentira: a mentira e a estatística. (George Bernard Shaw)

– Os economistas gostam de ficar brigando entre si para não correr o risco de estarem todos errados ao mesmo tempo. (John K. Galbraith)

Ambrose Gwinnet Bierce,
1842-1914
– Os Estados Unidos sempre tomarão a atitude acertada assim que esgotarem todas as alternativas. (Winston Churchill)

– Se fosseis tratar todas as pessoas de acordo com o merecimento de cada uma, quem escaparia da chibata? (William Shakespeare)

– Noventa por cento dos políticos dão aos dez por cento restantes uma péssima reputação. (Henry Kissinger)

– As coisas políticas no Brasil decidem-se por combinações provisórias. (Getúlio Vargas)


– Em política, a traição é uma questão de tempo. (Charles-Maurice de Talleyrand)